31 de jul. de 2005

O Entardecer da Esperança

Caro Gilmar,



Localizei o texto da Folha (Abaixo) e fiz a leitura recomendada. Não sei exatamente o que imaginei quando fizeste a menção durante o almoço, mas uma coisa posso dizer: pouco convenceu.

O texto, assim como o formato de boa parte da retórica petista costumeira, ainda trabalha demais com a essência onírica, habita em demasia um mundo das idéias e dos ideais, está encastelado ou ainda não desceu ao chão enlameado.

Talvez eu esperasse uma mudança de linha, de tática de persuasão, ou quem sabe esteja de fato desiludido/desesperançoso/cético, assumidamente traído.

Para mim, a desconfiança está em franca vantagem na luta contra a esperança.

Calcar a defesa nos desvarios da cúpula lembra, grosso modo e com considerável diferença, aquele quadro do Jô Soares em que se dizia que “a culpa é do governo”. Dentro da hierarquia do partido, até que estrato se encontra essa malsinada cúpula? Como delimitar? Apenas a cúpula conseguiu executar o alegado plano? Tenho dúvidas. Em outras palavras e em sentido figurado, não sei, assim como muitas vezes não sabe o médico, até que ponto o tumor canceroso toma o paciente, qual a profundidade e extensão da cirurgia. Desconfio dessa tática cartesiana. Parece salvacionismo de última hora, ou quem sabe de primeira, já que a viagem dos capitães até o eventual afundamento há de ser consideravelmente longa.

A atribuição da responsabilidade a um grupo interno determinado reedita as velhas disputas intestinas de poder, que, via de regra, em pouco resultaram, apenas marcando a dinâmica interna do partido. Agora, o que muda é o cenário: das plenárias e assembléias em sedes de sindicatos ou de associações outras, passaram para um quadro semelhante ao do hotel do balneário egípcio atacado pelos atentados, apenas restos desfigurados que ninguém reconhece mais o que foram outrora, aliás, essa é a minha sensação quanto a boa parte dos seres que relaciono ao PT, animados ou não.

Mais: será que um grupo conseguiria isolar completamente o acesso dos demais? Seria possível um governo hermético quanto aos demais grupos? Não haveria um tanto de conivência, ou ao menos omissão?

Erram ainda os autores do texto em não criticarem a intransigência da crítica pretérita, endereçada aos adversários históricos em termos de claro “irrealismo político”. Pela corrente dos dois, algo diferente seria difícil!

Encontrei no texto da valiosa dupla um tom que até então era música para os meus ouvidos e hoje me desperta, me faz desconfiado.

Em um ponto o texto parece acertar: quando busca retomar o fio da meada do PT pelo lado de lá, dos antanhos, e não pelo lado de cá, hoje bem instalado com farto escritório na política subterrânea nacional.

Um abraço,



Athos Calegari

26 de jul. de 2005

"Libertas quae sera tamen"

O seqüestro da esperança MIGUEL ROSSETTO e RAUL PONT
Um personagem estranho vaga pela cena política brasileira nas últimas semanas. Sob rajadas de denúncias, é acusado de vilezas que sempre apontou nos demais. Quem padece dessa forma é o PT, depositário das expectativas de um país melhor para milhões e milhões de brasileiros. Um PT que nem o Brasil nem seus militantes jamais haviam visto.
Diante disso, brotam as explicações sobre o fenômeno. Entre elas, a que descreve o PT, todo ele, como forjador do próprio aviltamento. Numa notável inversão, pede-se desculpas pelo PT ter tido no passado uma postura intransigentemente ética. Responsabiliza-se os paradigmas de esquerda e de igualdade fundadores da nossa identidade pelos fatos que, agora, são a sua negação. Numa espécie de autocrítica do outro, critica-se tudo o que fez o PT ser diferente, sem criticar nada que o faz ficar agora igual ao deformado sistema político brasileiro.
Se for assim, qual teria sido a influência de propostas tão caras ao espírito do PT na produção da crise que atordoa os brasileiros, petistas ou não? Qual a porcentagem desse tumulto que poderia ser debitada na conta, por exemplo, da velha bandeira petista do necessário controle da sociedade sobre o Estado? Qual a parcela de culpa atribuível à democracia direta, ao orçamento participativo? Qual fatia da responsabilidade poderia tocar às iniciativas republicanas de justiça social, de transparência e, sem esquecer, da inflexível defesa da ética?
Todos esses temas são a ossatura do PT, dialogando com sua razão de existir. Mas nenhum deles tem algo a ver com o quadro que aí está. Pelo simples motivo de que a crise não é de origem, mas de ruptura com a tradição do partido. Quem está no olho do furacão não é o projeto historicamente acalentado pelo PT e pelos petistas, mas justamente o avesso: a conseqüência mais constrangedora de um rompimento com tudo o que o PT sempre representou.
Na genética da crise está a fratura entre discurso e prática, o distanciamento das bases e dos movimentos sociais, a hegemonia da lógica eleitoral, a despolitização da política, as alianças não-programáticas e, especialmente, a auto-suficiência das decisões de cúpula.
O problema, portanto, não é o partido ou seus fundamentos teóricos. A crise não foi parida por sua biografia. Não deriva da essência do PT. Antes, provém de ações e omissões que representam justamente a sua negação.
Não são os 800 mil filiados e os milhões de simpatizantes que devem fazer sua autocrítica. Enquanto o partido sangra, são eles que, moídos pela decepção, enfrentam nas ruas o escárnio da direita que, agora, numa história repetida como farsa, se arvora guardiã da moral e dos bons costumes. E se multiplica em sorrisos que não ostentava tão luminosos desde a era da privataria. Eram os tempos em que expunha todos os dentes para os flashes ao som da batida do martelo em cada leilão em que se dissipava o patrimônio público. Projeto que sonha retomar.
Quem deve explicações é um grupo que praticou o seqüestro do partido e assassinou suas melhores esperanças. Agindo em nome do PT, mas sem compartilhar essas decisões com o conjunto do partido ou sequer comunicar-lhe suas deliberações, afogou uma história de 25 anos num lodaçal de suspeições. Um comportamento autista e autoritário, que cortou o contato com a realidade exterior para fabricar uma segunda e patética realidade. Na qual a vida real, das pessoas reais, é substituída por uma fraude, povoada de fantasmas, saques milionários e papéis queimados.
Esse não é o PT. Nenhuma dessas torpezas é fruto de suas convicções. Mas todos os petistas, agora, sofrem a mesma dor e perplexidade que nos afrontam e humilham. Que só aumenta com a desfaçatez de versões inaceitáveis. E de mentiras que antes duravam uma semana, depois dias, e agora se desmancham em horas. Como se necessitássemos ainda, depois de tudo, desse ritual diário de exasperação e vergonha.
Agora é o momento de uma resposta que o Brasil ainda não ouviu. Essa resposta terá de beber na fonte das melhores tradições cidadãs e democráticas e socialistas do PT. "Somos um Partido dos Trabalhadores não para iludir os trabalhadores", afirmava o manifesto assinado por gente como Mário Pedrosa, Lélia Abramo, Sérgio Buarque de Hollanda e outros tantos que já se foram. Naquela época heróica, Lélia Abramo andava com fichas de filiação nos bolsos. Batia de porta em porta ou interceptava pessoas nas ruas para convencê-las a assinar os papéis e, assim, somar as assinaturas necessárias para que o PT enfim existisse legalmente.
A resposta que falta também terá que deixar absolutamente claro para a sociedade brasileira que quem misturou o partido de Lélia Abramo, Chico Mendes e Henfil com "mensalões", malas de dinheiro e dólares nas cuecas não errou apenas de procedimento. Errou também de partido.
A história do PT não acaba aqui e não acaba assim. O seu futuro depende de um rigoroso ajuste de contas com o presente para dele emergir uma agenda radicalmente republicana, democrática e popular para o Brasil.
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Miguel Rossetto, 45, petroquímico, é o ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário. Foi vice-governador do Rio Grande do Sul. Raul Pont, 61, candidato à presidência nacional do PT, é deputado estadual no Rio Grande do Sul. Foi prefeito de Porto Alegre.

25 de jul. de 2005

Vira-bosta

"Após frustrar irremediavelmente a generosa expectativa da nação, resta ao Presidente reconhecer o estado de ingovernabilidade do país e propor ao Congresso uma emenda constitucional convocando eleições presidenciais para outubro.
Se o presidente tivesse dignidade, deveria renunciar. Seria uma saída democrática para a crise, em face da falta de legitimidade de um mandato construído por estelionato eleitoral
".

Tarso Genro, a respeito de FHC, em 1999.

Antonio Chimango, vulgo PT
Veio ao mundo tão flaquito,
Tão esmirrado e chochinho
Que, ao finado seu padrinho
Disse espantada a comadre:
- Virgem do céu, Santo Padre!

C’o tempo o coronel Prates
Se foi sentindo pesado;
Tinha muito trabalhado
Naquela vida campestre,
Onde ele, com mão de mestre,
Tinha tudo preparado.
Um dia chamou o Chimango
E disse: “Escuta, rapaz,
Vais ser o meu capataz;
Mas, tem uma condição:
As rédeas na minha mão,
Governando por detrás.
(...)

Sei que tu és maturrango,
Porém, dou-te a preferência.
Nisto está minha ciência,
Escolhendo-te entre os outros;
Eles sabem domar potros,
Mas, tu tens a obediência.
(...)

Então chamou o Aureliano,
Pardo velho muito antigo,
Que conservava consigo
Assim como secretário;
Espécie de relicário
De família, muito amigo.
“Tu, que és um conhecedor
De como tudo se faz,
Ensina-me a esse rapaz
As manhas de governar,
Que ele vai desempenhar
O cargo de capataz.”
(...)

À sombra de uma figueira
Sentados num cabeçalho,
O Aureliano, sem atalho,
Disse: “Agora, meu menino,
Eu te vou dar o ensino
Do que aprendi no trabalho.
(...)

Quando um erro cometeres
(O que bem se pode dar)
Não deves ignorar
Como se sai da rascada:
A culpa é da peonada;
O patrão não pode errar.
Quando vires um peão,
Mesmo o melhor no serviço,
Ir pretendendo por isso
Adquirir importância...
Bota pra fora da Estância,
Mas, sem fazer rebuliço.”
(...)

Um dia..., ansim de repente,
Esta notícia correu:
– O coronel Prates morreu!
(...)

Pobre Estância de São Pedro
Que tanta fama gozaste!
Como assim te transformaste
Dentro de tão poucos anos,
De destinos tão tiranos
Não há ninguém que te afaste!
(...)

Na mão do triste Chimango
O arvoredo está no mato;
O gado... é só carrapato;
O campo... cheio de praga.
Tudo depressa se estraga,
No poder de um insensato.
(...)

E ansim, tudo na Estância
Vai mermando devagar,
Tudo de pernas pra o ar,
Nem tem mais vergonha a gente;
Mas, o Chimango... contente
Que é coisa de admirar!

22 de jul. de 2005

A implosão da mentira

Por Afonso Romano de Sant'Anna

"Mentiram-me.
Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente.
Mentem de corpo e alma completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.



Mentem sobretudo impunemente.
Não mentem tristes,
alegremente mentem.
Mentem tão nacionalmente
que acho que mentindo história a fora
vão enganar a morte eternamente.



Mentem, mentem e calam
mas nas frases falam e desfilam de tal modo nuas
que mesmo o cego pode ver a verdade em trapos pelas ruas.
Sei que a verdade é difícil e para alguns é cara e escura,
mas não se chega à verdade pela mentira
nem à democracia pela ditadura.



Evidentemente crer que uma flor nasceu em Hiroshima
e em Auschwitz havia um circo permanentemente.



Mentem, mentem caricaturalmente,
mentem como a careca mente ao pente,
mentem como a dentadura mente ao dente
mentem como a carroça à besta em frente,
mentem como a doença ao doente,
mentem como o espelho transparente
mentem deslavadamente como nenhuma lavadeira mente ao ver a nódoa sobre o rio
mentem com a cara limpa e na mão o sangue quente,
mentem ardentemente como doente nos seus instantes de febre,
mentem fabulosamente como o caçador que quer passar gato por lebre
e nessa pilha de mentiras a caça é que caça o caçador
e assim cada qual mente indubitavelmente.



Mentem partidariamente,
mentem incrivelmente,
mentem tropicalmente,
mentem hereditariamente,
mentem, mentem e de tanto mentir tão bravamente
constróem um país de mentiras diariamente."



(Afonso Romano de Sant'Anna é mineiro-carioca. O poema acima tem como título "A implosão da mentira".) Copiei do Blig do Noblat:

O Exército de Cambises

Parodiando o livro do escritor Paul Sussman (O Exército Perido de Cambises), pode-se dizer que há divisões inteiras de petistas soterradas, não na areia do deserto das idéias, mas na lama produzida pelos dirigentes. Nem podia ser diferente. O chamado Campo Majoritário, aquele que detém a chave do cofre, venceu todas as eleições e comandou a sigla com quem cuida de um armarinho de secos e molhados: comprando e vendendo. Não contente em ter produzido tudo isso que é vedado aos olhos, narizes e ouvidos das crianças, o mesmo grupelho, provando que a estrela é cadente, alijou outras tendências do PT e colocou Tarso Genro para esconder o entulho, que ainda não veio à tona, embaixo do tepete vermelho.
No texto anterior há uma palhinha do que se passa pela cabeça de tantos ex-petistas que viram o sonho virar lama, a esperança virar traição, a ideologia virar trinta dinheiros nas mãos de beijadores de criancinhas em épocas de eleição.
VIDA CURTA AO TRAIDORES!

A Esperança

Vê-se que não é mais possível sustentar ingenuamente a ausência de contaminação do Governo com toda a sorte de improbidades e negociatas que vêm sendo revolvida à custa da grande chafurda orquestrada pela oposição e governo...O grande plano do Partido dos Trabalhadores de se perpetrar no poder a qualquer custo, implementando eficientemente os ensinamentos de Maquiavel, parece não ter encontrado barreiras naquelas férteis terras do Planalto, tão acostumadas à germinação de práticas antigas espúrias, as quais deviam já estar planejadas e encontravam-se ocultas sob o pentagrama-símbolo. A esperança, último dos elementos que restara da Caixa de Pandora aberta por Epimeteu, que na visão de Nietszche era a pior das mazelas, capaz de impedir a ação da busca da verdade, acaba de deixar o povo, pois esvazia-se com o mito toda uma oportunidade, até então pensada e ansiada como possível por uma Nação inteira. O abandono da esperança, corolário óbvio destes tempos, sepulta, especialmente aos mais vulneráveis socialmente, a chance de, ainda no processo em curso, verem algumas de suas demandas de subsistência atendidas. No entanto, àqueles que pensam em soluções mais efetivas de longo prazo, a subtração da esperança pode levar à consecução da verdade e da recomposição da ética e da moralidade no Brasil. É certo que o processo ora deflagrado possui prismas complexos e variados ângulos de análise, sobre os quais competentes cientistas políticos, políticos, sociólogos e estudiosos pátrios, bem como do exterior, debruçar-se-ão durante muito tempo tentando entendê-lo em sua plenitude, formulando muitas hipóteses na busca das respectivas causas e conseqüências de tudo o que vem acontecendo. A par disso, tudo o que vem ocorrendo, e do quanto ainda vai ser levantado pelas esferas próprias, na vida política do País vem sendo objeto de singela, mas percuciente, análise do cidadão comum, do homo medius, que, em suma é o definidor dos rumos e futuros dos governos e das nações. Este cidadão, que possui o poder legítimo de escolher seus representantes e de apeá-los do poder, e que está se sentindo traído quanto a sua esperança, está fazendo seus juízos de valor acerca dos deslizes éticos, morais e criminais em exame, e, com certeza, vai em busca da verdade. Todos temos consciência de que a opinião pública volta-se aos acontecimentos do Planalto, e aos demais episódios que enxundiam a ética e a moralidade para com a coisa pública em nosso País, tais como as propinas de Rondônia, e os escândalos de sonegação de conglomerados financeiros, e os classifica no justo padrão de crise geral de moralidade e ética, com todos os desdobramentos que esta avaliação pode representar. Tais conclusões, visíveis na sociedade em geral, deve soar como um alerta aos nossos dirigentes políticos de que a população, livre de sua esperança, anseia pela verdade e por justiça e está cansada do marketing, e que, os que não concorrem positivamente para o alcance de tais anseios vão ver suas esperanças eleitoreiras espalharem-se ao vento, como os demais elementos do mito.

Aldronei Rodrigues

20 de jul. de 2005

Estado de Direita

Não bastasse as barbaridades perpetradas pelo lulismo e PesTismo desvairados, vem a FIESP declarar o que entende por Estado de Direito.
Vamos ver se entendi o recado da FIESP. A Polícia Federal, após um tempo de fiscalização, ancorada nos pareceres da Receita Federal e com mandados judiciais em mãos, botou o templo dos esnobes na vitrine da boca do lixo. Digo, provou e comprovou que a DASLU tomou do teu, do meu, do nosso dinheiro. Em outras palavras, sonegou, aquilo que o assalariado não pode fazer porque desconta na fonte. E aí, ao invés de receber uma reprimenda do empresariado paulista, a DASLU recebe condolências exatamente porque sonegou. E aí a barbaridade: A fiscalização, os procedimentos da Polícia Federal, estribado no mais formal dos requisitos legais, é tido pela FIESP como se fosse contra o Estado de Direito. Eu, o mais comum dos mortais, entendi que o Estado de Direito da FIESP é aquele em que se pode sonegar impunemente, e com louvar da emplumada estirpe dos barões bandeirantes, como no tempo do Borba Gato. Conclusão: sonegar é com a FIESP. Ilegal é punir sonegador!

19 de jul. de 2005

A FIESP é contra: POR QUÊ?

Com exceção do colunista abaixo, a imprensa paulista, patrocinada pela FIESP, está revoltada contra a Polícia Federal, a Receita e o Ministério Público Federal. Eis aí por que os políticos também se sentem à vontade para roubar. Se todos os ricos podem, porque eles não podem? Locupletemo-nos todos!


LUÍS NASSIF - Folha de São Paulo, 19/07/2005
Por dentro da operação Daslu
A crise Daslu e a crise PT têm um ponto em comum: o início do trabalho profissional integrado entre Polícia Federal, Ministério Público e Secretaria da Receita Federal. A partir do momento em que se apertou o torniquete sobre doleiros e esquemas "offshore", tirou-se o oxigênio do submundo político e empresarial.
Alguns detalhes de como foi montada a operação Daslu demonstram o profissionalismo da ação.
Os funcionários da Receita e da Polícia Federal foram convocados na sexta-feira, dia 8. Os técnicos achavam que seria uma ação contra sacoleiros em Foz do Iguaçu. Na segunda-feira, às 17h, ficaram sabendo que deveriam levar paletó e gravata. Pensaram em pente fino no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos.
Às 16h do dia 12, chegaram ao auditório da Superintendência da SRF, na avenida Prestes Maia. O superintendente avisou que iriam imediatamente para Guarulhos e ficariam hospedados no Ibis.
No jantar, foram informados de que deveriam estar prontos para partir às 2h30 (madrugada). Saíram em 30 carros e foram para a sede da PF em São Paulo, em um auditório em que se encontravam os 240 delegados e agentes da instituição. Os superintendentes da PF e da SRF e o procurador informaram que a operação se chamava Narciso e que iria desmontar o esquema Daslu. Avisaram que anteciparam a operação em razão de vazamento de informação e de haver muita gente influente envolvida.
As equipes foram montadas com um delegado da PF, dois ou três agentes da PF (com submetralhadoras), um ou mais auditores da SRF e o motorista. Em cada equipe, o delegado recebeu um kit com os mandados e os termos necessários; o auditor da SRF recebeu uma pasta mostrando todo o esquema fraudulento e indicando os documentos de interesse para apreensão. Só aí souberam os endereços a serem investigados.
Não houve abusos, relata um auditor. Os agentes não apontaram arma para ninguém, ninguém humilhou qualquer pessoa. "Recebemos ordens para agir discretamente e fomos educados. Os auditores da SRF receberam ordens para não dar entrevistas. Tanto é que tinha gente que saía da loja e nem havia percebido a nossa presença", conta ele.

Esquema
Segundo o relato desse auditor, o esquema Daslu, na verdade, funcionava assim:
1) A empresa de Miami comprava o vestido por US$ 1.000 e exportava com notas de importadoras de fachada por US$ 100.
2) A importadora de fachada pagava os impostos no desembaraço no valor da nota subfaturada e repassava para a Daslu praticamente sem margem de lucro. Não pagava nenhum tributo (exceto os do desembaraço). Depois de 12 ou 14 meses, fechava as portas com prejuízos.
3) Na loja, o tal vestido era vendido por valor equivalente a US$ 4.000 e era emitida nota fiscal. Porém duas das três equipes que foram ao endereço antigo encontraram caixas que continham notas fiscais de venda de 2004 e de 2005 com todas as vias, inclusive as do fisco, além de outros documentos importantes (fluxogramas de operação), escondidos em caixas, com a palavra "Incinerar".

15 de jul. de 2005

De onde vem a lama

Tinha prometido para mim que não mais me deixaria envolver com sujeira, seja política ou econômica. Tinha vontade de falar do "melhor amigo do homem", de literatura, história, essas coisas. Mas aí aparece o caso DASLU. O Ministério Público e a Polícia Federal, portanto, servidores públicos, descobrem que a empresa é chique até na sonegação. E, na hora do aperto, os empresários se solidarizam. E condenam os servidores públicos.
De fato, o Brasil precisa de choque de credibilidade, em todos os níveis. A Classe Política está com cheiro saindo pelo ladrão, e o empresariado nunca foi de fazer a sua parte. E numa hora dessas, o apoio à DASLU não é solidariedade, é conluio, formação de quadrilha. Empresário honesto, que trabalha e honra seus compromissos deveria ficar enojado com os expedientes da DASLU de ganhar dinheiro. Os que se solidarizaram confirmam do que são feitos. Se os pobres fossem solidários entre si como são os empresários, o Brasil não seria campeão em desigualdade. Afinal, se cada vez que um pobre for preso por pegar um shampoo todos os pobres se solidarizassem, estariam demonstrando um comportamento menos censurável que os empresários que foram apoiar os sonegadores da DASLU.
Se formos verificar, a lama que atola o Brasil não vem dos servidores públicos, vem do esgoto de duas entidades: dos políticos e empresários.




O esquema DASLU - Luís Nassif
Pode-se criticar ou não o caráter espetacular da ação da Polícia Federal no caso Daslu. Mas todos os sinais indicam efetivamente a montagem de uma quadrilha para dupla sonegação de impostos.
A primeira sonegação era no subfaturamento das importações. Um produto de 100 entrava no país por 10. O Imposto de Importação incidia sobre 10. Digamos que fosse de 100%. Em vez de pagar 100, pagam-se apenas 10.
Aí a empresa importadora revendia para a Daslu por 125. Se o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) fosse de 25%, a empresa ficava devedora de 25 de imposto. E a Daslu ficava credora desses 25, compensando na hora de pagar o seu ICMS.
Digamos que revendesse o produto por 150. Ficava devendo 37,5 de ICMS, mas compensava com os 25 que a importadora supostamente pagou, pagando apenas 12,5 de impostos. Aí, a importadora -fantasma- fechava e não recolhia os impostos devidos. Ou seja, a Daslu se apropriava de uma compensação que não foi paga.
No exemplo mencionado, se fosse uma operação normal, a Daslu teria pago 100 de Imposto de Importação, mais 50 de ICMS. No total, seriam 150. Com a dupla sonegação, pagava apenas 22,5 (10 de imposto de importação, mais 12,5 de ICMS). Ou seja, era um processo graúdo e sistemático de sonegação.
Não é apenas ela quem fazia isso. Há sinais de que alguns templos do povão praticavam o mesmo processo.