12 de fev. de 2006

A mosca azul do pré-conceito

Conta Plutarco que o jurista grego, Sólon, responsável pelo fim das leis de Dracon (draconianas...), costumava ficar em silêncio nas assembléias. Sendo um dos sete sábios da Grécia antiga, o povo cobrou explicações:
- Quem sabe o que dizer, também sabe quando dizer! - justificou Sólon.
O dublê de psicanalhista e cronista social, Contardo Calligaris, exercita seu preconceito com os muçulmanos (FSP, 12/02/2006), com um argumento dos que não o possuem. A respeito das charges publicadas pelos jornais dinamarqueses, Contardo não tenta explicar o que elas sugerem. Uma pelo menos vende a idéia de que todo muçulmano é terrorista. Isso ele não diz. Claro, ele tem bons serviços prestados em defesa de Israel. E ponto. Mas engraçado mesmo é o principal argumento da "Carta aberta às elites religiosas muçulmanas". Pretende mostrar que os manifestantes nas portas das embaixadas são aspirantes frustrados de migrarem para os países europeus. Isto é, a culpa é das elites que não sabem distribuir riqueza e educação para os manifestantes. Puxa, houve um tempo que os ingleses migraram para a América. Italianos, japoneses, portugueses, turcos e alemães vieram aos borbotões ao Brasil. Isso não tinha nada a ver com fundamentalismo religioso. Aliás, muitos dos que tentam trabalhar de lixeiro nos EUA são latino americanos onde o catolicismo e capitalismo mandam há pelo menos quinhentos anos.
Contardo, como todo mentiroso, se preocupa apenas com detalhes que reforça sua tese anti-muçulmana. Tantos os argelinos na França, quanto turcos na Alemanha, ou egípcios e indianos na Inglaterra, são tributo de um passado colonial. As matrizes se abasteceram dos respectivos tesouros, como a Espanha e Portugal fizeram na América Latina, e agora não querem de volta como migrantes. Aliás, a lógica é essa: a coca-cola pode migrar para qualquer país, isto é, o poder econômico, mas as pessoas, não. No governo do dileto amigo de Contardo, o professor Cardoso, um diplomata brasileiro precisou tirar o sapato para entrar nos EUA. Essa é a lógica dos democratas. A mesma lógica adota por Israel com relação ao vitorioso Hamas: "converso com qualquer um, desde que seja com Isaac".
O míope Contardo só consegue ver terrorismo entre os muçulmanos. Ele não lembra Oklahoma? Ele não sabe o que a CIA faz pela América Latina? Os prisioneiros de Guantánamo estão sob jurisdição de que Estado de Direito? Ah, já sei, os fins justificam os meios... mas só para americanos... Contardo não se sente constrangido em usar os mesmos argumentos de Bush? Por quê?
Se a liberdade fosse incondicional, por que Siegfried Ellwanger não pode continuar mentido, ao afirmar que não houve holocausto judeu na Segunda Guerra?
Nenhum povo é santo, embora alguns se considerem. A diferença é que enquanto um reconhece as barbaridades cometidas pelos outros. A Turquia não reconhece o genocídio dos armênios; Israel, dos palestinos (Sharon está proibido de entrar na Bélgica por quê?) ; os EUA, dos índios e agora dos afegãos e iraquianos.
Então, meu caro Contardo, enquanto os argumentos forem estes, enquanto não souberes o que dizer, pelo menos para não demonstrar de forma tão clara todo seu preconceito, cultive pelo menos um pouco de silêncio.